ENTENDENDO A PENA DE MULTA

A pena de multa está prevista nos artigos 49 a 52 do Código Penal e, não raro, é aplicada juntamente com outras penas, como a prisão, por exemplo.

Apesar de o artigo 60 do Código Penal prever que a Justiça deve considerar a situação econômica do réu na hora de determinar a pena de multa, ainda que a condenação seja no número mínimo de dias-multa, muitas vezes o valor já é expressivo para a pessoa condenada.

Nesse sentido, não são raras as vezes em que a multa deixa de ser paga, trazendo diversas consequências para a pessoa sobrevivente do sistema prisional:

O QUE É A PENA
DE MULTA?

A pena de multa é uma espécie de pena, por meio da qual o juiz estabelece uma quantia em dinheiro a ser paga ao Estado para custear o sistema de cumprimento de pena no país.

Esse valor será destinado ao Fundos Penitenciário Nacional e estaduais que, em tese, deveriam aplicar os recursos em melhorias e manutenção de unidades prisionais.

COMO A MULTA
PENAL É APLICADA?

A pena de multa pode ser aplicada de diversas formas:

Multa autônoma ou isolada – quando a multa é a única pena estabelecida na sentença penal condenatória.

Multa alternativa – quando a multa é determinada em substituição à prisão, ou seja, é uma alternativa à pena privativa de liberdade.

Multa complementar – quando a multa é aplicada em conjunto com a pena de prisão. Dessa forma, o juiz estabelece o tempo de prisão e um valor a ser pago de multa penal. A maior parte dos crimes previstos no Código Penal prevê a aplicação da multa junto com a prisão.

Multa substitutiva – quando a multa é compreendida como pena alternativa, em geral para crimes em que o tempo de prisão não ultrapassa 6 (seis) meses.

COMO CALCULAR A MULTA

O cálculo da multa penal é feito em dois momentos, atendendo a um duplo critério. No primeiro momento, o juiz fixa o número de dias-multa, que será de no mínimo 10 e, no máximo, 360 dias-multa para a maior parte dos crimes previstos na legislação penal brasileira. Porém, é preciso ficar atento, já que no caso do tráfico de drogas, a multa pode variar entre 500 (quinhentos) e 1500 (mil e quinhentos) dias-multa. Ainda, vale dizer que há crimes em que não está prevista a possibilidade de aplicação de multa penal.

Para tomar a decisão sobre a quantidade de dias-multa no caso concreto, o juiz leva em consideração as circunstâncias do crime, causas agravantes e atenuantes, bem como causas de aumento e diminuição de pena. Desta forma, é possível fixar o número de dias-multa no mínimo ou no máximo previsto em lei, e quem vai decidir isso é o juiz, quando da análise do crime cometido.

Após a decisão sobre o número de dias-multa aplicado no caso específico, o juiz passa a estabelecer o valor unitário de cada dia-multa. Esse valor unitário do dia-multa varia entre 1/30 do salário-mínimo e até 5 (cinco) salários-mínimos vigentes. Na determinação do valor unitário do dia-multa, o juiz analisa a situação econômica do réu. Assim, se o juiz avaliar que o réu é necessitado, e não possui condições financeiras, buscará fixar o valor do dia-multa no mínimo, ou seja, 1/30 do salário-mínimo. Mas se ao contrário, o juiz avaliar que o apenado tem uma boa condição financeira, ele pode fixar o valor do dia-multa em até 5 (cinco) salários-mínimos.

É a Justiça que determina, na sentença, a quantidade de dias-multa, considerando o que estabelece o Código Penal para o crime cometido, e a quantidade do salário-mínimo vigente a ser utilizada para calcular o valor da multa penal em determinada situação.

Em 2023, o valor do salário mínimo é de R$ 1.320,00. Considerando o salário-mínimo vigente (R$ 1320,00), cada dia-multa varia entre R$ 44 e R$ 6.600,00. O número de dias-multa bem como o valor de cada um deles vão depender da gravidade do delito praticado e da capacidade econômica da pessoa condenada.

O QUE ACONTECE SE EU NÃO PAGAR A PENA DE MULTA?

  • A pena não será extinta, ainda que você tenha cumprido todo o tempo de prisão;
  • Os direitos políticos ficarão suspensos, ou seja, não será possível regularizar o título de eleitor, votar e ser votado, e tampouco participar de concurso público enquanto não houver o pagamento da multa;
  • Os antecedentes criminais não poderão ser apagados por meio da reabilitação criminal, e assim o(s) crime(s) cometidos continuarão aparecendo na folha de antecedentes;
  • O nome pode ser protestado no cartório de títulos e ficar “sujo”, trazendo restrições ao CPF, bem como limites e impedimentos às opções de crédito, à abertura de contas em banco, ao acesso a determinados benefícios sociais etc.
  • Bens móveis e imóveis, bem como parcela do pecúlio ou salário da pessoa devedora da multa penal podem ser penhorados para o pagamento da dívida;
  • A impossibilidade de progressão de regime também é um tema que tem sido discutido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, mas ainda não há decisão definitiva sobre o tema.

QUANTO CUSTA
A MULTA PENAL?

O valor vai depender do crime praticado e da avaliação do juiz ao aplicar a pena. Mas fique atento porque o valor pode variar de R$ 40 a mais de R$ 2 milhões para crimes contra o patrimônio, por exemplo. Já para delitos relacionados à lei de drogas, o mínimo previsto para aplicação da multa é R$ 20 mil, podendo chegar a mais de R$ 9 milhões.

COMO A PENA DE MULTA
FUNCIONA NA PRÁTICA?

Até recentemente, a multa penal era considerada uma dívida de valor. Assim, caso não fosse possível realizar o pagamento, isso não impediria que a pena tivesse um ponto final. Ou seja, o devedor conseguia recuperar seus direitos políticos, regularizar sua documentação e retomar a vida em sociedade.

Mas uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018, decretou que a multa tem caráter penal, ou seja, deixou de ser considerada uma dívida de valor e se tornou parte do cumprimento de pena. Em outras palavras, mesmo que já se tenha cumprido tempo na prisão, por exemplo, a pena segue em aberto até que se pague o valor devido. A decisão do STF também determinou que o responsável por cobrar a multa é o Ministério Público (órgão que acusa e que é responsável por abrir ou não uma ação criminal). A nova interpretação do STF foi seguida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e consolidada pela chamada Lei Anticrime (Lei 13.964/2019).

MAS E SE NÃO FOR POSSÍVEL PAGAR A MULTA?

Mesmo que a pena de multa tenha sido aplicada no mínimo previsto em lei, é provável que ainda assim não seja possível pagar o valor determinado na sentença correspondente aos dias-multa. Muitas pessoas saem do cárcere contando com apoio de seus familiares para retomar a vida em liberdade. Há ainda uma dificuldade enorme em regularizar toda a documentação, acessar benefícios sociais e conseguir emprego formal. Sem dinheiro para pagar a multa após sair da cadeia, ficam em dúvida sobre o que fazer nessa situação.

Primeiro, é importante frisar que em momento algum a multa penal será convertida em prisão. Porém, a pendência do pagamento da multa penal pode trazer uma dificuldade ainda maior no exercício de direitos de cidadania, acarretando inúmeros impactos negativos para a retomada da vida em liberdade.

Há quem busque um possível parcelamento da multa penal. O parcelamento, porém, dependerá do valor, do juiz e das condições do condenado em cumprir com seu pagamento. Nessa linha, é preciso lembrar que não há como se comprometer com um parcelamento cujo valor não será possível arcar. O ideal é buscar na justiça a isenção do pagamento da multa por ausência de condições financeiras e a consequente extinção da pena.

Para que haja isenção da multa e que seja possível colocar um ponto final no cumprimento de pena, é preciso que o devedor(a) comprove, por meio de documentos, que não tem recursos financeiros para pagar o valor determinado pelo juiz. Mesmo que se tenha cumprido o tempo de prisão, é necessário que o juiz reconheça que a pessoa não possui condições de arcar com a multa.

O Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que se o condenado comprovar que não pode pagar o valor da multa penal, ele pode ter reconhecida a extinção da pena.

Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que comprovar impossibilidade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade.

(Tema Repetitivo 931/STJ)

Não há na legislação uma lista específica de documentos que podem ser utilizados para comprovar a condição econômica do réu. Dessa forma, assim como no pedido de justiça gratuita para outros tipos de causas, pode ser feita uma declaração de próprio punho da condição de pobreza, assinada pelo próprio declarante (réu). Também podem ajudar nessa comprovação os extratos bancários, as notas e/ou recibos contendo os gastos com despesas essenciais, e até mesmo documentos que demonstram que se encontra em situação de rua ou acolhido em abrigo temporário. Nesse caso em específico, o próprio centro de acolhida pode fazer uma declaração para demonstrar a situação de rua. Todos os documentos que possam servir para demonstrar a condição de pobreza devem ser fornecidos ao defensor do caso e posteriormente juntados ao processo para que possa ser declarada a isenção da multa no âmbito da execução e consequente extinção da pena.

 

QUANDO A MULTA DEVE SER PAGA?

O pagamento pode ser feito voluntariamente no prazo de 10 dias, contados a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, quando não se pode mais recorrer da decisão.

Caso o valor da multa seja pago dentro desses 10 dias, o juiz extinguirá a multa (se ela tiver sido a única pena aplicada) ou anotará o pagamento, informando a quitação do valor ao juiz responsável pela execução da pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos.

Mas se a multa não for paga dentro do prazo estipulado, o Ministério Público é informado e a cobrança passa a ser feita no juízo da execução, que será, neste momento, o responsável por acompanhar o cumprimento das penas estipuladas na sentença, dentre elas, a multa.